E a fazenda Boavista no Deserto Desnudo
Gabriel Francisco Ribeiro Junqueira, citado às fls. 1.272 em, Família Junqueira: Sua História e Genealogia, era neto materno de Gabriel Francisco Junqueira, Barão de Alfenas e de Ignácia Constança. Era filho de Marianna Victória de Andrade Junqueira e José Ribeiro da Luz.
Gabriel assina como testemunha em alguns atos de revisão e demarcação das terras pertencentes à Freguesia de Santana das Lavras do Funil, termo de São João del Rey, distrito das Carrancas. O referido documento foi registrado no Livro de Transcrições dos Imóveis à p. 31 sob o número 241 em Lavras, no dia 13 de abril de 1893. O Oficial de Hipotecas era Manoel Lázaro de Azevedo. Além de Gabriel, assinam como testemunhas Luiz Antônio de Oliveira e Antonio Penha de Andrade.
Nosso interesse nesse documento se dá tendo em vista a citação de uma porteira de chave, termo utilizado para locais por onde circulavam nossas riquezas - presença de portas, porteiras fechadas a chave. A memória registrada e transmitida através da comunicação oral, nos lembra do cômodo com guichê presente na construção da Fazenda da Barra de São Domingos.
Lemos em um trecho do referido documento assinado por Gabriel: "(...) por este após o vallo seguindo a mesma divisa até encontrar a divisa de Francisco de Paula Ferreira, seguindo esta até encontrar o muro da porteira de chave, voltando à direita e seguindo sempre a mesma divisa de José Joaquim Alves (...)".
Em nossa visita a Fazenda da Barra, no ano de 2005 ouvimos das pessoas que lá estavam preparando o jantar e quitutes para comemoração do Natal: "aqui era ponto de encontro de tropeiros".
Vídeo: O Tropeiro de Carmo da Cachoeira
Deserto Dourado — ponto de encontro de tropeiros procedentes de vários pontos da região
O texto extraído do Almanaque Civil e Industrial revela aspectos geográficos e econômicos de Varginha. Figura a Freguesia da Cachoeira do Carmo da Boa Vista, como parte ativa na composição da riqueza local, através da produção de alimentos de primeiras necessidades e da criação do gado vaccun, muar, lanigero e, suíno. O documento foi assinado em 1º de agosto de 1864 em Ouro Preto. Eram quatro os juízes de paz: José Fernandes Avelino, Antonio Joaquim Alves, Antônio Dias Pereira de Oliveira e Custódio Vilella Palmeira. Foi a época em que figurava como Pároco, o Revmo. Joaquim Gomes de Rezende.
Por onde escoava a parte que nos corresponde no montante dessa riqueza?
Importa essa freguesia em gênero do fóra para mais de 50:000$000 e exporta os de sua producção no valor de 120:000$000.
Capela de São Domingos da Barra com movimento intenso de registros eclesiásticos
Vejamos:
Livro de Registro de Batizados na Capela de São Domingos da Barra.
- JOSE, filho de Antônio Alves de Figueiredo c.c. Cândida Nicézia Branquinho, aparece no livro 3, fl. 232, Distrito de Carmo da Cachoeira, em 29.10.1818;
- ANA, filha do Cp. Joaquim Fernandes Ribeiro de Rezende c.c. Jacinta Ponciana Branquinho, liv. 03, fl. 233 na Capela de São Domingos da Barra, Distrito de Carmo da Cachoeira, 23.3.1913;
- MARIA, filha de José Dias de Gouvea c.c. Maria Ferreira de Assunção, liv. 03, fl. 234, sob número 975, na Capela de São Domingos da Barra, Distrito de Carmo da Cachoeira, 24.10.1813; e
- JOAQUINA, filha do alferes Joaquim José dos Reis c.c. Maria Custódia do Nascimento, sendo padr. Tomé Ferreira de Jesus e sua esposa Michaela Roza, liv. 03, fl. 232 v. na Capela de São Domingos da Barra, Distrito de Carmo da Cachoeira, 1.12.1812.
Reminiscências da Fazenda da Boa Vista no Deserto Desnudo
O prof. Wanderley Ferreira de Rezende, nascido em 1905 em Carmo da Cachoeira, Minas Gerais, ouviu com atenção, registrou e publicou um conto sobre um antigo tropeiro de nome Venâncio, do séc. XVIII. Nas palavras de Venâncio, o caso verídico aconteceu "há mais de 200 anos, o tropeiro era patrão de meu bisavô que, por tradição de família, chegou a meu conhecimento."
Esse conto denominado A NOIVA DO TROPEIRO foi publicado na obra Gaveta Velha, folha 19 e também no jornal Arauto do Sul - em 15 de novembro de 1942. No jornal a publicação vem assinada por Turibio - pseudônimo adotado pelo prof. Wanderley, e o conto diz respeito à antiga fazenda Boa Vista.
A paragem da Boa Vista é citada na Carta Sertanista do ano de 1793. Ao se referir a esta fazenda, o professor Wanderley escreve:
Único núcleo de civilização que havia em meio de muitas e muitas legas de terras desabitadas, era lá o ponto obrigatório para onde convergiam todos os tropeiros e viajantes, que se aventuravam pelas estradas inóspitas, cortadas por entre as matas virgens e os cerradões infindáveis e que ligavam o leste ao oeste de Minas.
Como quase todas as fazendas antiga, Boa Vista possuía o seu engenho de cana, as senzalas, habitações dos escravos. Para um lado da casa grande, a casa do tronco, onde se castigavam os escravos rebeldes. Ali perto e um pouco melhores do que as senzalas, ficavam as habitações das mucanas, escravas que gozavam certas regalias e eram encarregadas de serviços caseiros como costurar, cardar a lã, fiar e tecer nos teares de madeira, indispensáveis em todas as fazendas.
O rancho de pouso de tropeiro e viajantes ficava a um quilómetro, mais ou menos, para leste da fazenda e até hoje, como que por tradição, ainda existe no mesmo lugar um rancho mantido por descendentes dos antigos Branquinhos e que fica na encruzilhada das estradas que ligam Carmo da Cachoeira a São Bento e Lavras a Três Corações.
Do ponto de vista eclesiástico, no século XVIII, moradores do Sítio Cachoeira e as demais fazendas do DESERTO DESNUDO batizavam seus filhos ou realizavam casamentos em Carrancas e Lavras, no entanto, tinham como opção o altar portátil de Pe. Bento Ferreira Villa Nova até o ano de 1775, quando este se recolheu deixando de exercer os ofícios do ministério sacerdotal.
A capela de São Bento continuou a registrar batizados e casamentos, no entanto, a partir de 1782 passou a condição de ermida de São Bento, conforme constam dos registros. Além de São Bento encontramos, também, vários registros na Capela São Domingos da Barra.
A fazenda Boa Vista, no Deserto Desnudo, sede do Distrito, até o ano de 1799 não tinha provisão para capela ou ermida. Temos em nossos arquivos belas fotos da Ermida da Fazenda Taquaral, no distrito da Boa Vista, no entanto, não encontramos a referida provisão. Assim, moradores da Boa Vista, buscavam outras igrejas. Gilberto Vilela e eu encontramos no livro 2 de batizados de Lavras, a seguinte anotação:
Batismo de Vicente, filho legítimo de João e Isabel, escravos de José Joaquim Gomes Branquinho na Capela de São Bento. Foram padrinhos de Vicente, Manoel escravo de José Supliciano dos Reis e Perpétua, escrava de Manoel Pereira Guimarães. A celebração aconteceu em 27.1.1799.
Uma pergunta ficou no ar: porque a sede do Distrito não tinha capela? Realmente, o que ocorre é que as cartas de sesmarias norteavam as ações dos concessionários. Eram comuns as orientações "(...) possuirá a dita meya legoa de terra com condição de nella não sucessederem Religiões, Igreja ou Eclesiástico por título algum e acontecendo possuíllas será com o incargo de pagarem dellas Dizimos como qualquer seculares (...)".
A vida no sertão foi marcada por sofrimentos indescritíveis. Lugar desamparado que reduz o povo às necessidades elementares da subsistência e o põe a prova. Para nós cristãos, viver o deserto é viver um tempo intermédio para crescimento de consciência para forjar a resistência e cultivar a esperança para viver da promessa: "E eu estarei sempre com vocês, até o fim dos tempos" (Mt. 28:20). E é exatamente, nos sertões do Deserto Desnudo que vamos encontrar Manoel Antonio Rates.
O desenvolvimento, conforme estamos estudando, caminhava no século XVIII em nossa região no sentido leste-oeste. Vejamos por exemplo, o que na simplicidade, Venâncio, do conto ouvido pelo professor Wanderley diz: "Naquela época a cidade mais próxima era São João del Rey, cuja Comarca era denominada Rio das Mortes".
No conto A noiva do Tropeiro era filha de um dos Branquinhos, José Joaquim Gomes Branquinho, casado com Maria Vitória dos Reis aos 16 de junho de 1776, fazendeiro, fazenda Boa Vista. O referido professor diz: "Ao lado esquerdo da estrada que leva Carmo da Cachoeira à cidade de São Bento Abade está situada a fazenda da Boa Vista construída lá pelos séculos 18".
Deserto Desnudo — rancho de tropeiros século XVIII
Com vimos o Almanake Administrativo, Civil e Industrial 1864 a 1884 da Fundação Biblioteca Nacional, "o distrito produzia além de milho, feijão e arroz, os fazendeiros cultivavam a canna, café, mamona, algodão branco e ganga e raízes tuberosas. Criavam gado, ovelhas, suínos, entre outros".
- Por onde escoavam as mercadorias produzidas no distrito da Boa Vista?
- Como esta fazenda e outras espalhadas por este sertão eram abastecidas?
- Por onde entravam os escravos recém-comercializados pelos fazendeiros?
- Se, através das águas, onde ficava o porto mais próximo?
- Seria a fazenda da Barra, no Deserto Dourado o ponto de intersecção com Barbacena e Borda do Campo?
Comentários