Além da política de segredo, Martinho de Mendonça revela as estratégias utilizadas para conseguir-se a prisão dos poderosos: aproveitou-se a época das cheias, quando as viagens ficavam difíceis e espalharam-se as notícias de que o Intendente ia apenas arrecadar os bens já seqüestrados dos outros culpados. Esses dois fatos deixaram os demais suspeitos tranqüilos de que os oficiais não se arriscariam a ir muito longe em estação tão perigosa para a saúde, pois com as enchentes, vinham as epidemias.
Na carta do dia 19 de julho, ele já comunica a prisão do capitão dos amotinados: “(…) dou a V. Excelência os parabéns da prisão de capitão dos amotinados”¹. A desordem ocasionada pelos motins parece chegar ao fim com a prisão do capitão dos amotinados. Em 23/07/736, Martinho de Mendonça descreve o suposto capitão: é um mameluco, filho de uma carijó². Ao ressaltar a condição de mameluco do prisioneiro, Martinho de Mendonça tira a importância do motim, pois foi chefiado por pessoa desqualificada, nascida no sertão. Interessa-nos destacar aqui, a presença de índios e seus filhos nas Minas, uma vez que esses personagens praticamente não aparecem na história de Minas Gerais.
Todavia, o governador deixou registrado que esse conflito envolveu pessoas de várias etnias e categorias sociais, revelando que apesar das diferenças, poderia haver uma perigosa união entre esses indivíduos, quando estavam em questão os seus direitos presumidos. Era essa coligação que causava temor e tremor nos Ministros reinóis.
Em novembro de 1736, Martinho de Mendonça menciona a prisão de Pedro Cardozo, um rico
morador do sertão e filho de Maria da Cruz, o qual ele denomina “provocador do povo levantado”:
A 15 de outubro sei que o Desembargador Sebastião Mendes de Carvalho se achava no Brejo do Salgado continuando a devassa acompanhado de parte do Destacamento com o Tenente:
O Capitão ficou em São Romão aonde tem onze presos entre eles Pedro Cardozo provocador do Povo levantando, que era quem dava baixa e nomeava os cabos, dizem-me que este homem tem em fazendas e gados mais de cinqüenta mil cruzados.³
Pedro Cardoso era também sobrinho de Domingos do Prado Oliveira. Ele possuía extensa
fazenda de gado, além de se ocupar do comércio de sal, ferragens e gêneros da Bahia. Era considerado um dos principais potentados no noroeste de Minas e possuidor de uma fortuna incalculável. Ele foi enviado com sua mãe e mais quatorze presos para o Rio de Janeiro de onde seguiriam para a Bahia, por serem considerados os principais líderes da sedição.
Durante o tempo em que o sertão esteve sublevado, Martinho tentou esconder seus sentimentos de preocupação, os quais só revelou ao final do seu período de interinidade. Ele afirma que sua apreensão era maior pela falta de forças militares para controlar a situação e recomenda que se conservem tropas na região, subordinadas a oficiais em que se possa confiar e que lá permaneçam “com satisfação”:
Entretanto, isso ainda não justificaria plenamente essa ação de tanta violência; para ele são outras as razões para a revolta: o estabelecimento de uma Intendência e todo o seu aparato legal e de segurança; e a coibição do roubo de escravos dos viajantes que passavam pela região.
Apesar de reconhecer que a região era muito independente em relação à metrópole, Martinho de Mendonça indica o remédio, que ele julga eficaz, para conter essas tendências à autonomia: expandir o braço da justiça e da força policial até o sertão, mesmo que isso custe muito a Fazenda Real.
Trecho do trabalho: Uma rede de potentados: o motim de 1736 nos sertões das Minas Gerais
Profª. Irenilda Cavalcanti
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1. Carta de Martinho de Mendonça para Gomes Freire de Andrade, de 19/07/1736, RAPM, v. 16, n. 2, p. 338, 1911.
2. Carta de Martinho de Mendonça para Gomes Freire de Andrade, de 23/07/1736, RAPM, v. 16, n. 2, p. 339, 1911.
3. Carta de Martinho de Mendonça para Gomes Freire de Andrade, de 08/11/1736, RAPM, v. 16, n. 2, p. 377, 1911.
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