O Sertão Oeste mineiro era um local fora do controle das autoridades. Por mais que tentassem controlar as terras e os homens pouco ou nada conseguiam. Pode ser visto na documentação com clareza, o caráter oscilatório desta fronteira, ou melhor dizendo, das fronteiras. Regiões eram conquistadas de índios ou grupos quilombolas e entregues ao povoamento. Pouco tempo depois, os povoadores recuavam em virtude de ataques destes mesmos grupos, fazendo com que os limites que separavam a civilização e a barbárie estivessem sempre em movimento.
Estudos têm demonstrado que enquanto nos EUA o avanço da fronteira criou um mito de origem capaz de unir todo o povo americano e assim explicar sua origem, no Brasil a conquista de áreas que estavam fora do controle não provocou o mesmo processo. Muito pelo contrário, a conquista do Oeste brasileiro acabou produzindo dois mitos que não unem o povo: o mito da Amazônia e o do Sertão. Este último foi formulado nos primeiros séculos de povoamento e o sertão foi identificado como local de difícil moradia, distante, remoto e isolado, sem lei ou ordem. Só era habitado por seres inferiores e somente homens valorosos poderiam conquistá-lo¹:
“...no Brasil, os mitos relativos à Conquista do Oeste não são mitos de origem... Esses mitos têm caráter regional e não são mitos de inclusão, pois não são capazes de incluir a nação inteira numa única narrativa...não contribui para criar ou reforçar qualquer sentimento de identidade nacional...”²
O conceito de fronteira trás consigo um outro que é o do espírito do homem da fronteira. Os participantes das expedições possuíam um sentido que os moviam em busca de outras regiões, sempre capazes de propiciar riquezas e glórias a seus desbravadores. Para os contextos de suas épocas eram homens vitoriosos. E vitoriosos porque conquistaram. Eram homens que não se prenderam a qualquer região. Uma vez já conquistadas partiam para outras em busca de outros locais e atrativos. Eram homens que nas áreas de interiorização exerciam todo o poder, os representantes legais das autoridades metropolitanas. E, portanto, eram temidos, respeitados e quase sempre obedecidos. Estes homens de fronteiras eram “... produto do encontro do português e do indígena...” e portavam em si próprios o “...encontro de hábitos, de etnias, de linguagens, em suma, de culturas...”³
Por tudo o que foi visto, pode-se afirmar que durante o século XVIII houve um projeto civilizador voltado para a Colônia. Embora tenha sido desenvolvido na Metrópole, tal projeto foi, em linhas gerais, absorvido pelas elites coloniais. Uma das principais idéias era a crença de que a sociedade branca vista como a “civilizada”, deveria incorporar outras áreas à fronteira colonial, preferencialmente ricas e com possibilidades de produzirem, mas que estavam sob o controle de bárbaros, ou seja, daqueles que não compartilhavam dos mesmos sistemas culturais e de valores. Para isso, era necessário eliminar de uma forma ou de outra, estes elementos.
Este projeto civilizador foi executado em regiões que poderiam propiciar algum tipo de retorno financeiro não só às próprias expedições que partiam para o seu controle, como também às elites locais e à metrópole.
Trecho de um trabalho de Marcia Amantino.
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1. AMADO, Janaina. Construindo mitos: a conquista do Oeste no Brasil e nos EUA. In: PIMENTEL, Sidney Valadares e AMADO, Janaina (org). Passando dos Limites. Goiânia: Ed. Da UFG, 1995.
419 Idem p. 68
420 LIMA, Nísia Trindade. Um sertão chamado Brasil. Rio de Janeiro: Revan: IUPERJ, UCAM, 1999 . p. 743
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