Existindo ouro ou não, o mito da Lagoa Dourada permaneceu no imaginário colonial e em pleno século XVIII havia uma região no Sertão Oeste de Minas Gerais chamada por este nome. É sintomático que Pamplona, líder de várias expedições que foram enviadas em busca dentre outras coisas de ouro, possuísse neste lugar uma fazenda e de lá exercia seu poder sobre a região.
Gabriel Soares de Souza (1587) foi um dos que também acreditava ser o Sertão uma área rica. Sua crença foi tal que partiu em busca da mesma lagoa. A expedição foi um fracasso e quase todos morreram, inclusive ele.
Frei Vicente do Salvador (1627) via a questão sob um outro prisma: além de possuir ouro e prata esta parte de terra retinha também uma outra riqueza - os índios que poderiam ser escravizados.
“... Um soldado de crédito me disse que, indo de São Vicente com outros, entraram muitas léguas pelo Sertão, donde trouxeram muitos índios, e em certa paragem lhes disse um que dali a três jornadas estava uma mina de muito ouro limpo e
descoberto, donde se podia tirar em pedaços...”
Para o cronista, a “fome” por índios era tanta que os participantes das expedições quando localizavam minas de ouro, nada faziam:
“... quando vão ao Sertão é a buscar índios forros ...E é tanta a fome que disto levam que, ainda que de caminho achem mostras ou novas de minas, não as cavam nem ainda as vêem ou demarcam...”
Em toda a sua obra, Frei Vicente do Salvador mistura realidade com fantasia e afirma o que ele esperava da terra, uma vez que esta já fazia parte de seu imaginário. O que descrevia não era a realidade, mas sim o que se acreditava. Um exemplo disto é a sua descrição dos animais encontrados no Novo Mundo. Após relatar todos os que já eram conhecidos na Europa, passou a demonstrar a existência de seres fantásticos, povoadores do imaginário popular:
“... Há raposas e bugios ... chamados guaribas, que tem barbas como homens, e se barbeiam uns aos outros, cortando o cabelo com os dentes. Andam sempre em bandos pelas árvores e, se o caçador atira a algum e não o acerta, matam-se todos de riso; mas se o acerta e não cai, arranca a flecha do corpo e torna a fazer tiro com ela a quem o feriu, e logo foge pela árvore acima e, mastigando folhas, metendo-as na feridas, se cura e estanca o sangue com elas...”
Percebe-se nesta passagem o imaginário de uma época ainda muito povoada de mitos e lendas.
Os mitos indígenas confundindo-se com os portugueses e vice-versa.
Entretanto, a crença em mitos, lendas ou monstros não foi privilégio apenas dos séculos iniciais de nossa colonização. As regiões consideradas como fazendo parte dos Sertões mineiros eram tão pouco exploradas ainda no século XVIII que as imagens associadas ao maravilhoso permaneciam com bastante força.
Trecho de um trabalho de Marcia Amantino.
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